Hoje não um mas dois poemas de Fernando Pessoa. Não conseguia me decidir, então fiquei com os dois. E acrescento um terceiro, de minha própria autoria. e uma reflexão, um desejo, uma ausência que é presença, mas que está deixando de ser presença para ser só ausência...
Os dois poemas de Pessoa falam do desejo ardente de um amor. "Penso em ti e dentro de mim estou completo... Penso em ti, murmuro o teu nome; e não sou eu: sou feliz." Aqui Pessoa nos mostra o amor em si... aquele em que o objeto amado, mesmo que presente apenas em pensamento, preenche o nosso coração. E nesse momento, "não sou eu: sou feliz". A felicidade existe apenas por lembrar, por sentir a presença da pessoa. "Uma ausência que é tua presença", como disse em um poema meu que publiquei outro dia.
Mas um pouco à frente Pessoa mostra que isso apenas não lhe é suficiente... "Amanhã virás, andarás comigo a colher flores pelo campo." Andar comigo a colher flores... o que mais alguém poderia desejar? "Pois quando vieres amanhã e andares comigo no campo a colher flores, Isso será uma alegria e uma verdade para mim." E a presença desse amanhã preenche os dias... e o amanhã torna-se um outro amanhã, outro amanhã, outro amanhã... nos olhos de alguém que não vem... e a Serra da Boa Esperança vai ficando mais longe...
Corre pelos vagos campos até mim
e não sou eu: sou feliz.
uma brisa ligeira.
Penso em ti, murmuro o teu nome; e não sou eu: sou feliz.
E eu andarei contigo pelos campos ver-te colher flores.
Eu já te vejo amanhã a colher flores comigo pelos campos,
Pois quando vieres amanhã e andares comigo no campo a colher flores,
Isso será uma alegria e uma verdade para mim.
E nesse amanhã que vira amanhã que vira amanhã... "O amor é uma companhia..." e o desejo da presença dela, que não vem, é substituído pela presença desse amor... que enche o tempo, que preenche os espaços, que completa a alma. Ela, mesma, não vem. E "mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo"... e nessa presença que é plena de ausência, "toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio". E o girassol vai acompanhando a luz... seguindo os movimentos, e a cara dela no meio, como um doce fantasma, segue os nossos passos, sempre presente, sempre ausente, sempre, sempre...
Já não sei andar só pelos caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo.
Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.
Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela.
Todo eu sou qualquer força que me abandona.
Toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio.
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo.
Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.
Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela.
Todo eu sou qualquer força que me abandona.
Toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio.
Mas esse girassol um dia começa a cansar de girar... e o desejo de ir colher as flores, que já começam a murchar, já que "Vai alta no céu a lua da Primavera", começa a aumentar, e essa ausência que é presença começa a se transformar em ausência que é apenas ausência... Ausência da presença, ausência da coragem, ausência de jogar-se, de arriscar, de ferir-se e de lamber as feridas... Ah, a vontade de machucar-se mais que a segurança de ficar protegido. Nesse momento, aparece o desejo de uma decisão... a ausência não mais preenche o espaço das flores que não foram colhidas. E nesse momento, permito-me modestamente acompanhar Pessoa com outro dos poemas de minha autoria...
Teu corpo e teus olhos dizem sim: tua boca diz não.
Mais uma vez, em ti quer o amor fazer morada.
O frio vento do medo tenta derrubar as paredes.
Seus olhos mais uma vez habitaram meu pensamento
Chegada é a hora de queimar a ponte da angústia,
E corajosamente atravessar o ponto sem volta.
Nas águas perigosas do rio da paixão
Vamos nadar entre corredeiras e redemoinhos
E descobrir o que existe após a curva do rio:
Cachoeiras e remansos, para sempre escondidos,
Dos covardes que observam das margens.
O frio vento do medo não permite que se queime a ponte da angústia. Ausências que sempre nos prendem no cais, e nos impedem de atirar-nos no rio da paixão. O convite não é aceito... E os covardes que observam das margens começam a me olhar... e seu olhar cortante cada vez mais me incomoda, me dói... e chega a hora em que, qual o poeta neurastênico que pula do navio, pula-se na água... não do rio da paixão, mas de um outro rio... da solidão, do medo, da insegurança. E ao pular, olha que pulou só... e que o seu amor ficou observando na margem enquanto o rio te enleva. E a imagem daquele amor, a te observar covardemente da margem a se afastar, passa da ausência que é presença a ausência que é ausência, a ausência, ausênci... ausênc... ausên... ausê... aus... au... a... ... ... ... E nas cachoeiras e remansos escondidos de quem ficou na margem, a esperança de algo novo começa a crescer, novas paisagens, novas primaveras, novas flores...
Ao pular no rio, num último desejo de viver a presença, o amante recorre a Caetano Veloso ou a Tim Maia, na música de Peninha... "Às vezes no silêncio da noite, eu fico imaginando nós dois"... Mas esse imaginar já não satisfaz... O medo do rio clama por companhia "Tô me sentindo muito sozinho..." O pensamento já não basta... Olha para a margem e onde está ela? "Porque você me esquece e some? E se eu me interessar por alguém?" Quem será que estará após a curva do rio? Alguém? Ninguém? Quem? Talvez a conclusão inevitável apareça... "Ou você me engana ou não está madura... Onde está você agora?" E a maturidade não está em ser racional, mas em ser um pouco louco... "Mais louco é quem me diz... e não é feliz... eu sou feliz" e nessa loucura que é ser racional, finalmente ele se joga... e seus gritos de vem comigo ficam cada vez mais longe, mais longe, mais longe... E o olhar vai se distanciando... aparece a curva do rio... um último olhar antes do absoluto nada é trocado... e começam lentamente a aparecer nas margens a esperança das novas flores.
Peninha - Sozinho
Às vezes no silêncio da noite
Eu fico imaginando nós dois
Eu fico ali sonhando acordado
Juntando o antes, o agora e o depois
Por que você me deixa tão solto?
Por que você não cola em mim?
Tô me sentindo muito sozinho
Por que você não cola em mim?
Tô me sentindo muito sozinho
Não sou nem quero ser o seu dono
É que um carinho às vezes cai bem
Eu tenho os meus desejos e planos secretos
Só abro pra você mais ninguém
É que um carinho às vezes cai bem
Eu tenho os meus desejos e planos secretos
Só abro pra você mais ninguém
Por que você me esquece e some?
E se eu me interessar por alguém?
E se ela, de repente, me ganha?
E se eu me interessar por alguém?
E se ela, de repente, me ganha?
Quando a gente gosta
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
Ou você me engana
Ou não está madura
Onde está você agora?
Ou não está madura
Onde está você agora?
Quando a gente gosta
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
Ou você me engana
Ou não está madura
Onde está você agora?
Ou não está madura
Onde está você agora?
Ouça a música nos links abaixo:
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