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quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

59 - Fernando Pessoa: Quer pouco: terás tudo; Dick Farney: Não tem solução


Fernando Pessoa falando sobre o desapegar-se.  A doutrina budista: necessite de pouco. Mas é complicado querer pouco... especialmente quando se gosta. e aí, Dick Farney diz que "Não tem solução"...  não sei o que faça com esse amor demais. Será que há alguma solução para  a convivência entre o querer e o não querer?

Quer pouco: terás tudo.
Quer nada: serás livre.
O mesmo amor que tenham
Por nós, quer-nos, oprime-nos.

Dick Farney: Não tem solução

Não tem solução
este novo amor

Um amor a mais
me roubou a paz
Eu que esperava 
nunca mais amar
não sei o que faça
com este amor demais

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

58 - Fernando Pessoa: Tão cedo passa tudo quanto passa!; Elis Regina: Andança

Fernando Pessoa manda que nos circundemos de rosas... o mais é nada... E Elis Regina fala que "na mão direita rosas vou levar";;; e a declaração de amor "por onde for, quero ser seu par'.


Tão cedo passa tudo quanto passa! 
Morre tão jovem ante os deuses quanto 
Morre! Tudo é tão pouco! 
Nada se sabe, tudo se imagina. 
Circunda-te de rosas, ama, bebe 
E cala. O mais é nada.

Elis Regina - Andança
Vim tanta areia andei
Da lua cheia eu sei, uma saudade imensa
Vagando em verso eu vim vestido de cetinm
Na mão direita rosas vou levar
Olha a lua mansa...(me leva amor)
Se derramar
Ao luar descansa
Meu caminhar..(amor)
Meu olhar em festa...(me leva amor)
Se fez feliz
Lembrando a seresta
Que um dia eu fiz
(por onde for quero ser seu par)
Já me fiz a guerra...(me leva amor)
Por não saber
Que esta terra encerra
Meu bem-querer...(amor)
E jamais termina
Meu caminhar ...(me leva amor)
Só o amor me ensina
Onde vou chegar
(por onde for quero ser seu par)
Rodei de roda andei, dança da moda eu sei
Cansei de ser sozinha
Verso encantado usei, meu namorado é rei
Nas lendas do caminho Onde andei
No passo da estrada...(me leva amor)
Só faço andar
Tenho a minha amada
A me acompanhar..(amor)
Vim de longe léguas
Cantando eu vim...(me leva amor)
Vou não faço tréguas
Sou mesmo assim
(por onde for quero ser seu par)
Já me fiz a guerra...(me leva amor)
Por não saber
Que esta terra encerra...(amor)
Meu bem-querer
E jamais termina
Meu caminhar...(me leva amor)
Só o amor me ensina
Onde vou chegar
(por onde for quero ser par)


terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

57 - Fernando Pessoa: Para ser grande, sê inteiro; Elis Regina: Redescobrir

Fernando Pessoa, em um de seus poemas mais fortes, embora minúsculo. Um dos maiores conselhos e reflexões de Pessoa: para ser grande, sê inteiro. Seja você, seja todo em cada coisa. Vive a vida... inteira, forte, despudorada. E para viver desse modo, a cada dia a gente deve estar se reinventando, se descobrindo. Para isso , Elis Regina em "Redescobrir". Linda a letra e forte a interpretação.

Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive


Música

Elis Regina - Redescobrir


Como se fora a brincadeira de roda
Memória!
Jogo do trabalho na dança das mãos
Macias!
O suor dos corpos, na canção da vida
Histórias!
O suor da vida no calor de irmãos
Magia!
Como um animal que sabe da floresta
Memória!
Redescobrir o sal que está na própria pele
Macia!
Redescobrir o doce no lamber das línguas
Macias!
Redescobrir o gosto e o sabor da festa
Magia!
Vai o bicho homem fruto da semente
Memória!
Renascer da própria força, própria luz e fé
Memorias!
Entender que tudo é nosso, sempre esteve em nós
História!
Somos a semente, ato, mente e voz
Magia!
Não tenha medo meu menino povo
Memória!
Tudo principia na própria pessoa
Beleza!
Vai como a criança que não teme o tempo
Mistério!
Amor se fazer é tão prazer que é como fosse dor
Magia!
Como se fora a brincadeira de roda
Memória!
Jogo do trabalho na dança das mãos
Macias!
O suor dos corpos na canção da vida
Histórias!
O suor da vida no calor de irmãos
Magia!
Como se fora a brincadeira de roda
Memória!
Jogo do trabalho na dança das mãos
Macias!
O suor dos corpos na canção da vida
Histórias!
O suor da vida no calor de irmãos
Magia!
Como se fora a brincadeira de roda
Memória!
Jogo do trabalho na dança das mãos
Macias!
O suor dos corpos na canção da vida
Histórias!
O suor da vida no calor de irmãos
Magia!
Como se fora brincadeira de roda
Jogo do trabalho na dança das mãos
O suor dos corpos na canção da vida
O suor da vida no calor de irmãos
Como se fora brincadeira de roda
Jogo do trabalho na dança das mãos
O suor dos corpos na canção da vida
O suor da vida no calor de irmãos

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

56 - Fernando Pessoa: De la musique; Boca Livre: Toada


Fernando Pessoa, em De la musique, pergunta se os dois terão mesmo se encontrado? Seria apenas uma suposição? Para acabar com a dúvida do encontro, Boca Livre, em Toada, convida a que o encontro realmente aconteça “Vem, morena ouvir comigo essa cantiga, sair por essa vida aventureira”. Tomara que o convite seja aceito...

De la musique

Ah, pouco a pouco, entre as árvores antigas, 
A figura dela emerge e eu deixo de pensar... 

Pouco a pouco, da angústia de mim vou eu mesmo emergindo... 

As duas figuras encontram-se na clareira ao pé do lago... 

...As duas figuras sonhadas, 
Porque isto foi só um raio de luar e uma tristeza minha, 
E uma suposição de outra coisa, 
E o resultado de existir... 

Verdadeiramente, ter-se-iam encontrado as duas figuras 
Na clareira ao pé do lago? 
(...Mas se não existem?...) 
...Na clareira ao pé do lago?...

Música

Boca Livre - Toada

Vem morena ouvir comigo essa cantiga
Sair por essa vida aventureira
Tanta toada eu trago na viola 
Prá ver você mais feliz
Escuta o trem de ferro alegre a cantar
Na reta da chegada prá descansar
No coração sereno da toada, bem querer
Tanta saudade eu já senti, morena
Mas foi coisa tão bonita 
Da vida, nunca vou me arrepender
Morena, ouve comigo essa cantiga
Sair por essa vida aventureira
Tanta toada eu trago na viola
Prá ver você mais feliz
Escuta o trem de ferro alegre a cantar
Na reta da chegada prá descansar
No coração sereno da toada, bem querer
Tanta saudade eu já senti, morena
Mas foi coisa tão bonita 
Da vida, nunca vou me arrepender
Vem morena (6x)
Vem morena ouvir comigo essa cantiga
Sair por essa vida aventureira
Tanta toada eu trago na viola 
Prá ver você mais feliz
Escuta o trem de ferro alegre a cantar
Na reta da chegada prá descansar
No coração sereno da toada, bem querer

domingo, 24 de fevereiro de 2013

55 - Fernando Pessoa: Colhamos flores; Chico Buarque e Nara Leão: João e Maria

Fernando Pessoa sugere que apenas colhamos flores... e Chico Buarque fala do amor épico "vem, me dê a mão, a gente agora já não tinha medo" que acaba "Pois você sumiu no mundo sem me avisar, e agora eu era um louco a perguntar, o que é que a vida vai fazer de mim"...

Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as 
No colo, e que o seu perfume suavize o momento — 
Este momento em que sossegadamente não cremos em nada, 
            Pagãos inocentes da decadência. 

Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-ás de mim depois 
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova, 
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos 
            Nem fomos mais do que crianças. 

E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio, 
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti. 
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim — à beira-rio, 
            Pagã triste e com flores no regaço.

Música

Chico Buarque - João e Maria

Agora eu era o herói
E o meu cavalo só falava inglês
A noiva do cowboy
Era você além das outras três
Eu enfrentava os batalhões
Os alemães e seus canhões
Guardava o meu bodoque
E ensaiava o rock para as matinês
Agora eu era o rei
Era o bedel e era também juiz
E pela minha lei
A gente era obrigado a ser feliz
E você era a princesa que eu fiz coroar
E era tão linda de se admirar
Que andava nua pelo meu país
Não, não fuja não
Finja que agora eu era o seu brinquedo
Eu era o seu pião
O seu bicho preferido
Vem, me dê a mão
A gente agora já não tinha medo
No tempo da maldade acho que a gente nem tinha nascido
Agora era fatal
Que o faz-de-conta terminasse assim
Pra lá deste quintal
Era uma noite que não tem mais fim
Pois você sumiu no mundo sem me avisar
E agora eu era um louco a perguntar
O que é que a vida vai fazer de mim?


sábado, 23 de fevereiro de 2013

54 - Fernando Pessoa: Todos os dias agora acordo com alegria e pena; Altemar Dutra e Cauby Peixoto: Brigas

Fernando Pessoa – estando na realidade onde está o que sonha. E em Brigas... Vejá só que tolice nós dois brigarmos tanto assim... pois sem amor, estamos sós, morremos nós.

Todos dias agora acordo com alegria e pena.
Antigamente acordava sem sensação nenhuma; acordava.
Tenho alegria e pena porque perco o que sonho
E posso estar na realidade onde está o que sonho.
Não sei o que hei-de fazer das minhas sensações.
Não sei o que hei-de ser sozinho.
Quero que ela me diga qualquer coisa para eu acordar de novo.

Quem ama é diferente de quem é 
É a mesma pessoa sem ninguém.

Música

Brigas – Jair Amorim e Evaldo Gouveia

Veja só
Que tolice nós dois
Brigarmos tanto assim
Se depois
Vamos nós a sorrir
Trocar de bem no fim
Para que maltratarmos o amor
O amor não se maltrata não
Para que se essa gente o que quer
É ver nossa separação
Brigo eu
Você briga também
Por coisas tão banais
E o amor
Em momentos assim
Morre um pouquinho mais
E ao morrer então é que se vê
Que quem morreu fui eu e foi você
Pois sem amor
Estamos sós
Morremos nós

Altemar Dutra e Cauby Peixoto: Brigas

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

53 - Fernando Pessoa: Estás só. Clara Nunes: Castigo e Fim de caso


Fernando Pessoa nos aconselha a nada esperar que em nós já não exista. As relações devem ser vivas... começam, tem seu auge e ocasionalmente acabam. O sonho é que permaneçam, afinal sempre se quer estar com alguém para ser feliz.
Mas para descrever quando o relacionamento acaba, Dolores Duran em duas canções: Castigo e Fim de caso. Na primeira, o arrependimento “Se eu soubesse
Naquele dia o que sei agora Eu não seria esse ser que chora Eu não teria perdido você”, e na segunda a constatação de quando a realidade ganha do sonho “Eu desconfio que o nosso caso está na hora de acabar Há um adeus em cada gesto, em cada olhar Mas nós não temos é coragem de falar”... Enfim , como diz Pessoa, “Estás só.”

Estás só. Ninguém o sabe. Cala e finge. 
Mas finge sem fingimento. 
Nada 'speres que em ti já não exista, 
Cada um consigo é triste. 
Tens sol se há sol, ramos se ramos buscas, 
Sorte se a sorte é dada.

Música

Clara Nunes - Castigo (Dolores Duran)

A gente briga, diz tanta coisa que não quer dizer
Briga pensando que não vai sofrer
Que não faz mal se tudo terminar
Um belo dia a gente entende que ficou sozinha
Vem a vontade de chorar baixinho
Vem o desejo triste de voltar
Você se lembra, foi isso mesmo que se deu comigo
Eu tive orgulho e tenho por castigo
A vida inteira pra me arrepender
Se eu soubesse
Naquele dia o que sei agora
Eu não seria esse ser que chora
Eu não teria perdido você
Se eu soubesse
Naquele dia o que sei agora
Eu não seria essa mulher que chora
Eu não teria perdido você

Clara Nunes - Fim de caso (Dolores Duran)

Eu desconfio que o nosso caso está na hora de acabar
Há um adeus em cada gesto, em cada olhar
Más nós não temos é coragem de falar
Nós já tivemos a nossa fase de carinho apaixonado
De fazer versos, de viver sempre abraçados
Naquela base do só vou se você for
Mas de repente, fomos ficando cada dia mais sozinhos
Embora juntos cada qual tem seu caminho
E já não temos nem coragem de brigar
Tenho pensado, e Deus permita que eu esteja errada
Mas eu estou, ah eu estou desconfiada
Que o nosso caso está na hora de acabar


quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

52: Fernando Pessoa: Ninguém a outro ama; Sílvio Caldas: Chão de estrelas

Fernando Pessoa lembrando que amamos não ao outro, mas aos nossos desejos que nele projetamos. Por isso amamos e deixamos de amar, sem que o outro tenha feito nada nem para uma ação nem para a outra. Não amamos o ser amado, senão o que de nós encontramos nele. Quando deixamos de encontrar essa parte escondida no outro, o amor se esvai... E esse amor, como diz Sílvio Caldas em Chão de Estrelas, “palhaço das perdidas ilusões”, lembrando a saudade das coisas simples (Ah, as coisas simples) do dia a dia e da mulher, pomba rola que voou...

Ninguém a outro ama, senão que ama 
O que de si há nele, ou é suposto. 
Nada te pese que não te amem. Sentem-te 
Quem és, e és estrangeiro. 
Cura de ser quem és, amam-te ou nunca. 
Firme contigo, sofrerás avaro 
      De penas.

Música

Sílvio Caldas, Chão de estrelas.

Minha vida era um palco iluminado
Eu vivia vestido de dourado
Palhaço das perdidas ilusões
Cheio dos guizos falsos da alegria
Andei cantando a minha fantasia
Entre as palmas febris dos corações
Meu barracão no morro do Salgueiro
Tinha o cantar alegre de um viveiro
Foste a sonoridade que acabou
E hoje, quando do sol, a claridade
Forra o meu barracão, sinto saudade
Da mulher pomba-rola que voou
Nossas roupas comuns dependuradas
Na corda, qual bandeiras agitadas
Pareciam estranho festival!
Festa dos nossos trapos coloridos
A mostrar que nos morros mal vestidos
É sempre feriado nacional
A porta do barraco era sem trinco
Mas a lua, furando o nosso zinco
Salpicava de estrelas nosso chão
Tu pisavas os astros, distraída,
Sem saber que a ventura desta vida
É a cabrocha, o luar e o violão

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

51 - Fernando Pessoa: Não sei se é amor que tens. Geraldo Azevedo: Dia branco

Fernando Pessoa aceitando o amor que se tem. Talvez na esperança de que o amor que se tem possa se transformar no amor que se quer...

Não sei se é amor que tens, ou amor que finges,
O que me dás. Dás-mo. Tanto me basta.
                Já que o não sou por tempo,
                Seja eu jovem por erro.
Pouco os deuses nos dão, e o pouco é falso.
Porém, se o dão, falso que seja, a dadiva
                É verdadeira. Aceito,
                Cerro olhos: é bastante.
                        Que mais quero?


Música

A esse amor que se tem e que se quer ter acima de tudo, Geraldo Azevedo promete o sol e a lua... se você vier pro que der e vier comigo...

Se você vier
Pro que der e vier
Comigo...
Eu lhe prometo o sol
Se hoje o sol sair
Ou a chuva...
Se a chuva cair
Se você vier
Até onde a gente chegar
Numa praça
Na beira do mar
Num pedaço de qualquer lugar...
Nesse dia branco
Se branco ele for
Esse tanto
Esse canto de amor
Oh! oh! oh...
Se você quiser e vier
Pro que der e vier
Comigo
Se você vier
Pro que der e vier
Comigo...
Eu lhe prometo o sol
Se hoje o sol sair
Ou a chuva...
Se a chuva cair
Se você vier
Até onde a gente chegar
Numa praça
Na beira do mar
Num pedaço de qualquer lugar...
E nesse dia branco
Se branco ele for
Esse canto
Esse tão grande amor
Grande amor...
Se você quiser e vier
Pro que der e vier
Comigo
Comigo, comigo.


terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

50 - Fernando Pessoa: A flor que és, não a que dás, eu quero; Sílvio Caldas: A deusa da minha rua

Fernando Pessoa pensando sobre as aparências... a flor que és, não a que dás, eu quero. Aqui relata-se que às vezes reconhecemos no ser amado muito mais que as aparências que ele dá a perceber... que conseguimos reconhecer lá no íntimo do ser amado as potencialidades que às vezes nem ele mesmo se deu conta...


A flor que és, não a que dás, eu quero.
Porque me negas o que te não peço?
Tão curto tempo é a mais longa vida,
        E a juventude nela!
Flor vives, vã; porque te flor não cumpres?
Se te sorver esquivo o infausto abismo,
Perene velarás, absurda sombra,
        O que não dou buscando.
Na oculta margem onde os lírios frios
Da infera leiva crescem, e a corrente
Monótona, não sabe onde é o dia,
        Sussurro gemebundo.

Música

Pensando na mulher que idealizamos, não na que necessariamente temos... e se pensarmos bem, sempre estamos com a pessoa que idealizamos. Quem cada um é, nem ele mesmo sabe...  Aqui temos Sílvio Caldas, em A deusa da minha rua... que sempre é na realidade quem queremos... não importa quem seja, importa quem sonhamos...

Sílvio Caldas: A deusa da minha rua



segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

49 - Fernando Pessoa: Segue o teu destino; Luiz Melodia e João Nogueira: Feitio de oração

Fernando Pessoa nos recomenda "Segue o seu destino". "Suave é viver só ... viver simplesmente, deixa a dor nas aras". Tomara que a gente consiga sempre fazer isso. Viver só não quer dizer falta de companhia, mas a gente bastar a nós mesmos. A companhia acrescenta, mas não é parte de nós...  E completando de alguma forma o pensamento de Pessoa, Noel Rosa em Feitio de Oração, afirma "Quem acha vive se perdendo Por isso agora eu vou me defendendo Da dor tão cruel desta saudade Que, por infelicidade, Meu pobre peito invade" Então vamos achar primeiro em nós mesmos, e depois em outro...

Segue o teu destino, 
Rega as tuas plantas, 
Ama as tuas rosas. 
O resto é a sombra 
De arvores alheias. 

A realidade 
Sempre é mais ou menos 
Do que nos queremos. 
Só nos somos sempre 
Iguais a nós-próprios. 

Suave é viver só. 
Grande e nobre é sempre 
Viver simplesmente. 
Deixa a dor nas aras 
Como ex-voto aos deuses. 

Vê de longe a vida. 
Nunca a interrogues. 
Ela nada pode 
Dizer-te. A resposta 
Está além dos deuses. 

Mas serenamente 
Imita o Olimpo 
No teu coração. 
Os deuses são deuses 
Porque não se pensam.

Música

Noel Rosa, em Feitio de Oração... quem acha vive se perdendo, na voz de Luiz Melodia e João Nogueira

Quem acha vive se perdendo
Por isso agora eu vou me defendendo
Da dor tão cruel desta saudade
Que, por infelicidade,
Meu pobre peito invade
Batuque é um privilégio
Ninguém aprende samba no colégio
Sambar é chorar de alegria
É sorrir de nostalgia
Dentro da melodia
Por isso agora lá na Penha
Vou mandar minha morena
Pra cantar com satisfação
E com harmonia
Esta triste melodia
Que é meu samba em feitio de oração
O samba na realidade não vem do morro
Nem lá da cidade
E quem suportar uma paixão
Sentirá que o samba então
Nasce do coração.

Ouça a música no link abaixo:

domingo, 17 de fevereiro de 2013

48 - Fernando Pessoa: Cada dia sem gozo não foi teu; Nunca a vontade alheia; Ney Matogrosso: Balada do Louco

     Fernando Pessoa nesses dois poemas nos convida à vida. No primeiro, com sua frase de abertura "Cada dia sem gozo não foi teu, foi só durares nele." Recordo-me de uma entrevista recente de Paulo Coelho, que ao falar sobre a morte, disse que ela era sua companheira. Estava o tempo todo sentada na careira ao lado, dizendo "- Vem comigo!" e ele respondendo "- Espera mais um pouco!". A esse respeito, disse que seu epitáfio será "Morreu enquanto vivia."  Longe se ser óbvio , como parece, nos leva a refletir se vivemos cada dia com gozo, como alerta pessoa, ou se só duramos nele. Então devemos refletir se a cada dia realmente o vivemos, estamos nele por inteiro.
    
Cada dia sem gozo não foi teu
Foi só durares nele. Quanto vivas
Sem que o gozes, não vives.
Não pesa que amas, bebas ou sorrias:
Basta o reflexo do sol ido na água
De um charco, se te é grato.
Feliz o a quem, por ter em coisas mínimas
Seu prazer posto, nenhum dia nega

A natural ventura!

 Para viver com gozo cada dia, Pessoa dá outro conselho no segundo poema: "Nunca a alheia vontade, inda que grata, Cumpras por própria. Manda no que fazes, Nem de ti mesmo servo."  Viva, faça o que lhe aprouver, "nem de ti mesmo servo", Não servir a ninguém, aos empregos necessários mas que te sugam a alegria da vida, nos relacionamentos automáticos que entraram na rotina e que se mantém sem mais gozo, nos prazeres que se buscam porque outros dizem que é prazeroso... Colhe tuas flores, explora teus regatos, canta tuas músicas. "Sê teu filho".

Nunca a alheia vontade, inda que grata,
Cumpras por própria. Manda no que fazes,
                Nem de ti mesmo servo.
Ninguém te dá quem és. Nada te mude.
Teu íntimo destino involuntário
                Cumpre alto. Sê teu filho.

     Mas ao viver a tua vida, ouvirás críticas. Reprimendas. Não se encaixa, dirão. Ser teu filho,gozar cada dia  de tua existência, conhecer lugares, emoções, pessoas, vida... Isso certamente tem um preço. Os "normais" vão chamar-te de louco. A esses responde como Ney "Dizem que sou louco por pensar assim Se eu sou muito louco por eu ser feliz, Mas louco é quem me diz, E não é feliz, não é feliz" Então, goza o teu dia, não te desculpes por seres quem és, paga o seu preço, Sê louco e Sê feliz.

Música

Ney Matogrosso: Balada do Louco

Dizem que sou louco por pensar assim
Se eu sou muito louco por eu ser feliz
Mas louco é quem me diz
E não é feliz, não é feliz
Se eles são bonitos, sou Alain Delon
Se eles são famosos, sou Napoleão
Mas louco é quem me diz
E não é feliz, não é feliz
Eu juro que é melhor
Não ser o normal
Se eu posso pensar que Deus sou eu
Se eles têm três carros, eu posso voar
Se eles rezam muito, eu já estou no céu
Mas louco é quem me diz
E não é feliz, não é feliz
Sim sou muito louco, não vou me curar
Já não sou o único que encontrou a paz
Mais louco é quem me diz
E não é feliz
Eu sou feliz

Ouça a música no link abaixo:



sábado, 16 de fevereiro de 2013

47 - Fernando Pessoa: Vai alta no céu a lua da primavera; O amor é uma companhia; Marcelo: Linda mulher,o que machucou seu coração; Caetano Veloso, Tim Maia: Sozinho


Hoje não um mas dois poemas de Fernando Pessoa. Não conseguia me decidir, então fiquei com os dois. E acrescento um terceiro, de minha própria autoria.  e uma reflexão, um desejo, uma ausência que é presença, mas que está deixando de ser presença para ser só ausência... 

Os dois poemas de Pessoa falam do desejo ardente de um amor. "Penso em ti e dentro de mim estou completo... Penso em ti, murmuro o teu nome; e não sou eu: sou feliz." Aqui Pessoa nos mostra o amor em si... aquele em que o objeto amado, mesmo que presente apenas em pensamento, preenche o nosso coração. E nesse momento, "não sou eu: sou feliz". A felicidade existe apenas por lembrar, por sentir a presença da pessoa. "Uma ausência que é tua presença", como disse em um poema meu que publiquei outro dia.
Mas um pouco à frente Pessoa mostra que isso apenas não lhe é suficiente... "Amanhã virás, andarás comigo a colher flores pelo campo." Andar comigo a colher flores... o que mais alguém poderia desejar? "Pois quando vieres amanhã e andares comigo no campo a colher flores, Isso será uma alegria e uma verdade para mim." E a presença desse amanhã preenche os dias... e o amanhã torna-se um outro amanhã, outro amanhã, outro amanhã... nos olhos de alguém que não vem... e a Serra da Boa Esperança vai ficando mais longe...



Vai alta no céu a lua da Primavera
Penso em ti e dentro de mim estou completo.
Corre pelos vagos campos até mim 
uma brisa ligeira.
Penso em ti, murmuro o teu nome; 
e não sou eu: sou feliz.



Amanhã virás, andarás comigo a colher flores pelo campo,
E eu andarei contigo pelos campos ver-te colher flores.
Eu já te vejo amanhã a colher flores comigo pelos campos,
Pois quando vieres amanhã e andares comigo no campo a colher flores, 
Isso será uma alegria e uma verdade para mim.


E nesse amanhã que vira amanhã que vira amanhã... "O amor é uma companhia..." e o desejo da presença dela, que não vem, é substituído pela presença desse amor... que enche o tempo, que preenche os espaços, que completa a alma. Ela, mesma, não vem. E "mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo"... e nessa presença que é plena de ausência, "toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio". E o girassol vai acompanhando a luz... seguindo os movimentos, e a cara dela no meio, como um doce fantasma, segue os nossos passos, sempre presente, sempre ausente, sempre, sempre...

O amor é uma companhia.
Já não sei andar só pelos caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo.
Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.
Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela.
Todo eu sou qualquer força que me abandona.
Toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio.

Mas esse girassol um dia começa a cansar de girar... e o desejo de ir colher as flores, que já começam a murchar, já que "Vai alta no céu a lua da Primavera", começa a aumentar, e essa ausência que é presença começa a se transformar em ausência que é apenas ausência... Ausência da presença, ausência da coragem, ausência de jogar-se, de arriscar, de ferir-se e de lamber as feridas... Ah, a vontade de machucar-se mais que a segurança de ficar protegido. Nesse momento, aparece o desejo de uma decisão... a ausência não mais preenche o espaço das flores que não foram colhidas. E nesse momento, permito-me modestamente acompanhar Pessoa com outro dos poemas de minha autoria...

Linda mulher, o que machucou teu coração?
Teu corpo e teus olhos dizem sim: tua boca diz não.
Mais uma vez, em ti quer o amor fazer morada.
O frio vento do medo tenta derrubar as paredes.

Ontem, entre risotos e vinhos, rosas e chocolates
Seus olhos mais uma vez habitaram meu pensamento
Chegada é a hora de queimar a ponte da angústia,
E corajosamente atravessar o ponto sem volta.

Vamos pular juntos dessa ponte em chamas
Nas águas perigosas do rio da paixão
Vamos nadar entre corredeiras e redemoinhos

E descobrir o que existe após a curva do rio:
Cachoeiras e remansos, para sempre escondidos,
Dos covardes que observam das margens.


O frio vento do medo não permite que se queime a ponte da angústia. Ausências que sempre nos prendem no cais, e nos impedem de atirar-nos no rio da paixão. O convite não é aceito... E os covardes que observam das margens começam a me olhar... e seu olhar cortante cada vez  mais me incomoda, me dói... e chega a hora em que, qual o poeta neurastênico que pula do navio, pula-se na água... não do rio da paixão, mas de um outro rio... da solidão, do medo, da insegurança. E ao pular, olha que pulou só... e que o seu amor ficou observando na margem enquanto o rio te enleva. E a imagem daquele amor, a te observar covardemente da margem a se afastar, passa da ausência que é presença a ausência que é ausência, a ausência, ausênci... ausênc... ausên... ausê... aus... au... a... ... ... ... E nas cachoeiras e remansos escondidos de quem ficou na margem, a esperança de algo novo começa a crescer, novas paisagens, novas primaveras, novas flores... 

Ao pular no rio, num último desejo de viver a presença, o amante recorre a Caetano Veloso ou a Tim Maia, na música de Peninha... "Às vezes no silêncio da noite, eu fico imaginando nós dois"... Mas esse imaginar já não satisfaz... O medo do rio clama por companhia "Tô me sentindo muito sozinho..." O pensamento já não basta... Olha para a margem e onde está ela? "Porque você me esquece e some? E se eu me interessar por alguém?" Quem será que estará após a curva do rio? Alguém? Ninguém? Quem? Talvez a conclusão inevitável apareça... "Ou você me engana ou não está madura... Onde está você agora?" E a maturidade não está em ser racional, mas em ser um pouco louco... "Mais louco é quem me diz... e não é feliz... eu sou feliz" e nessa loucura que é ser racional, finalmente ele se joga... e seus gritos de vem comigo ficam cada vez mais longe, mais longe, mais longe... E o olhar vai se distanciando... aparece a curva do rio... um último olhar antes do absoluto nada é trocado... e começam lentamente a aparecer nas margens a esperança das novas flores.

Peninha - Sozinho


Às vezes no silêncio da noite
Eu fico imaginando nós dois
Eu fico ali sonhando acordado
Juntando o antes, o agora e o depois
Por que você me deixa tão solto?
Por que você não cola em mim?
Tô me sentindo muito sozinho
Não sou nem quero ser o seu dono
É que um carinho às vezes cai bem
Eu tenho os meus desejos e planos secretos
Só abro pra você mais ninguém
Por que você me esquece e some?
E se eu me interessar por alguém?
E se ela, de repente, me ganha?
Quando a gente gosta
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
Ou você me engana
Ou não está madura
Onde está você agora?
Quando a gente gosta
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
Ou você me engana
Ou não está madura
Onde está você agora?

Ouça a música nos links abaixo: